Apesar de também ser uma vítima da sanguinária e impiedosa rotina de vida que nos cega para reflexões importante do dia a dia, me pesquei num raro instante de observação, desta vez voltada às embalagens de algumas marcas de fraldas descartáveis na farmácia (enquanto minha esposa solicitava medicamentos no balcão).
– Eita. Tem alguma coisa errada aqui nessa fralda! – comentei comigo mesmo.
Meu espanto era em ver o embrulho daquele amontoado de fraldas com a foto da mamãe toda sorridente ao lado de sua filha que retribuía o carinho.
– Oras. Cadê o pai nessa embalagem? Ele não age com meiguice? Pai não pode demonstrar carinho publicamente? – meditei um tanto indignado.
Ao mesmo tempo em que parecia surreal ‘descobrir’ que algo simples poderia passar (com a ausência do pai) uma mensagem tão individualista e injusta, também fiquei com a sensação de que eu era um papai-babão-doido-varrido me apegando em algo aparentemente tão insignificante para o mundo.
Afinal, quem foi o desocupado que olhou para a embalagem de fraldas descartáveis e deu falta do pai por lá? ahn? ahn? Sim, sim… eu mesmo!
Não devo ter sido o único que percebeu essa ausência de respeito disfarçada de fofura, mas, sendo ‘um dos’, sinto-me na obrigação de vir aqui externalizar um repúdio contra essa discriminação com os (verdadeiros) homens que honram sua paternidade.
Claro que a partir deste ponto de partida comecei a constatar que trata-se de uma prática de mercado em todos os setores da economia, cujo alvo comercial é gestante/bebê/criança. Desta forma, você raramente verá a foto do pai nas embalagens não apenas de fraldas, mas também de brinquedos, comidinhas e demais artigos que envolvam este público final.
É COMO SE, NA VISÃO DAS EMPRESAS, O PAI SIMPLESMENTE NÃO EXISTISSE!
E o mais triste nisso tudo é pensar que grande parte dos desenvolvedores de produtos e também das embalagens são homens com filhos, ou seja, ao invés de aproveitar a faca e o queijo que possuem para propagar igualdade e fazer a diferença de verdade, preferem reproduzir como papagaios a mensagem de que filho só tem mãe.
É mega preocupante ver que a sociedade nunca percebeu essa ausência dos pais nas embalagens, e que, embora lute por um planeta com pais melhores, ela também não luta pela igualdade parental e implicitamente endossa o coro de afastamento do genitor.
Por mais que alguns não vejam esse tema com a mesma preocupação/injustiça que eu, creio que devemos colocá-lo em voga sim.
Se não existe insatisfação pública do cliente, as marcas jamais buscarão se reposicionar de uma forma que agregue à educação dos nossos pequenos. Se não fizermos nenhum tipo de intervenção, elas seguem tranquilas para continuar com este “lindo” trabalho de atrelar os filhos somente às mamães, e indiscutivelmente, contribuir para que os pais nunca sejam verdadeiramente cobrados por serem pais (tirando das costas do homem uma responsabilidade que também é dele).
Embalagem de fraldas com a foto só da mãe é tão preconceituosa e arcaica quanto o caso de pais que proíbem a filha de brincar de carrinho ou o filho de brincar com bonecas.
Não existe só a mãe na fralda e não existe só o pai na fralda. Aliás, não deveria existir. O correto é darmos as mãos, consumidor e empresas, em prol de disseminar o amor em família, e quando acharmos que determinada situação não tem importância, lembremos que os gestos de condicionamento devem estar nos pequenos detalhes. Não podemos achar normal transmitir para os pequenos que o mundo é uma esfera onde todos os filhos não têm pai.
Hoje o mundo não é mais aquele retrógrado. O pai também troca fraldas, o pai também dá o ‘tetê’, o pai também compra brinquedos, o pai também passa a noite em claro, e, se necessário, o pai também faz escândalo em pronto-socorro. Sabe pq tudo isso? Pq, assim como a mãe, O PAI TAMBÉM AMA (e muito!).
Não existe essa de um ama mais do que o outro. Isso é papinho furado do século 17. Ambos amam igual e certamente dariam a vida pelo filho sem piscar.
Como seres pensantes que somos – ou que achamos ser -, devemos observar se o produto que está sendo oferecido maciçamente pela grande mídia entrega não apenas o que promete legalmente (o produto em si), mas, principalmente, se vem de uma marca que é comprometida moralmente com o mundo de uma forma humana.
É uma prática comum a qualquer pessoa olhar e não ver. Fazemos isso o tempo inteiro sem perceber, o que é extremamente perigoso, pois nos iludi em levar para casa uma ideia que dissemina intolerância, rejeição, discriminação e maus ensinamentos para nós e para os nossos filhos.
Será que você compra o que gostaria de comprar ou será que costuma pagar por um produto que lhe foi empurrado através de um trabalho publicitário bem feito?
Será que vale a pena adquirir uma marca/ideia mesmo que sua produção ou seu conceito vá totalmente contra os valores que tu leva como indispensáveis para a vida?
Quando uma marca de fraldas descartáveis age dessa forma, ela prova que não tem compromisso com seu cliente, e sim, apenas com o bolso dele. E qualquer empresa que hoje pense de forma sustentável deve colocar o cliente no centro do negócio e, mais do que lhe vender um produto, ela deve lhe proporcionar uma experiência mercadológica inesquecível.
E eu, como consumidor, posso afirmar que não vivencio qualquer experiência bacana como pai quando vou comprar algo para minha filha, simplesmente pq tudo é aparentemente fabricado para crianças que ‘só tem mãe’.
Então, está aí uma oportunidade de mercado para os grandes empresários do setor: criar produtos pensando também no pai e na família como um todo.
Hoje as pessoas pensam, amigos empreendedores e publicitários. Hoje as pessoas não são apenas braços ou bolsos, elas também são cérebro.
E se o interesse da tua empresa é continuar fornecendo serviços em longo prazo é bom repensar o jeito como tens tratado aquele que faz o salário cair na conta no fim do mês. Trate o cliente como amigo, trabalhe voluntariamente por um planeta com discursos melhores, e então jamais entrará para o time dos falidos.
Por um mundo em que os pais também sejam valorizados conforme o amor que emanam às suas crias.
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