Não é de hoje que as peças publicitárias da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) têm chamado minha atenção, essencialmente no que diz respeito aos episódios da série ‘Eu Sou a Universal’, exibido pelo grupo Record diariamente em sua programação.
Se você não teve a oportunidade de assistir, basicamente é o seguinte: o vídeo mostra o perfil de um homem ou uma mulher falando sobre como era sua vida antes de frequentar a IURD e as bênçãos que têm recebido ou que já recebeu…
PAUSA NO DETALHE: estrategicamente, essas pessoas representam variações de perfis, etnias, classes sociais e profissões, justamente pelos envolvidos na criação dessas peças publicitárias saberem que você vai se identificar com alguma das personagens. Até aí nada demais, já que no marketing funciona exatamente assim mesmo…
VOLTANDO: Bom, no fim das contas, encerram o texto dizendo: “Meu nome é fulano de tal, exerço tal profissão, moro em tal lugar e… EU SOU A UNIVERSAL!”.
Até aí sem novidade pq cada um é aquilo que desejar ser. Ok.
Mas em um dos episódios, especificamente, o abençoado em questão finaliza da seguinte forma: “Quer saber a razão? (de todas as bênçãos que recebi) Eu Sou a Universal!”
Ei, ei, ei… espera um pouco, campeão. Senti falta de um agradecimento especial para alguém aí, hein!? Como assim creditar nitidamente suas conquistas à igreja?
Será que tu não se esqueceste de Deus por um instante só para vangloriar o trabalho realizado pelo staff do bispo Edir Macedo? Ahn, ahn?
Não serei leviano em dizer que lá no início, nos anos 80, não existiam boas intenções da IURD para com seus fiéis por parte de seu fundador e das pessoas que o cercava. Contudo, o tempo foi passando e tornou-se nítido que o propósito inicial de “Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura” (Marcos 16:15) se perdeu pelo caminho.
E eu, por ter frequentado a IURD durante 14 anos, lamento demais quando vejo a forma como as coisas passaram a ser conduzidas por lá ao longo dos últimos anos.
O mais preocupante, porém, é saber que agora, mais do que nunca, ela não está sozinha nesse bolo, ou seja, infelizmente a Universal também ganhou concorrentes bem fortes no quesito ‘venda de milagres’ – para desespero das pessoas de bem que buscam um puro e verdadeiro afago espiritual.
Digo isso para trazer outro exemplo, agora da igreja Assembleia de Deus, mencionando que recentemente estava eu zapeando os canais da minha TV quando resolvi parar na pregação do pastor Silas Malafaia.
Olhando fixamente para a câmera, ele disse o seguinte: “Coloque um copo com água sobre a televisão pq EU vou te abençoar!”.
Cuma? Como é aí, moço?
Veja bem, ao invés de proferirem coisas como:
“Olha o que a Universal fez por mim” (que também ouvi em outro episódio)
ou
“Coloque um copo com água sobre a televisão pq EU vou te abençoar!”;
Que tal utilizarem algo do tipo:
“Quer saber a razão? (de todas as bênçãos que recebi) Eu Sou um(a) homem/mulher de Deus!”/“Olha o que Deus fez por mim!”
ou
“Coloque o copo com água sobre a televisão pq DEUS vai te abençoar!”.
Conseguem entender a inversão de valores e qual ‘marca e/ou produto’ querem de fato vender?
Creditar as conquistas do cliente, digo, do membro, para o Senhor dos Exércitos não é bom para os negócios, não é mesmo, queridos “líderes”?
Afinal, se você utiliza a palavra “Deus” acaba dando moral a um ‘produto’ que possivelmente consideram como neutro, e a pessoa pode, de repente, encontrá-lo em qualquer outra placa de igreja/empresa que não a da sua propaganda.
E isso não é, de forma alguma, interessante para o faturamento.
Imagino que os líderes religiosos pensem que o nome de Deus não precisa de marketing ou ser vendido por já ser consolidado em todo o mundo como um alguém inigualável, milagroso e do bem.
Tudo lindo, mas, em partes, discordo.
Claro que Deus não precisa de marketing e jamais deveria ser tratado como marca/produto. Porém, toda honra e toda glória deve ser dada sempre ao responsável pelo feito, independente do valor que Ele já tenha para as pessoas.
Exemplo chulo: se o Pelé faz um golaço, o árbitro não deve validar o tento para o zagueiro Joãozinho só pq o Pelé já é o Pelé.
Não faz sentido.
Se Deus é o responsável pelos milagres em sua vida, deve ser integralmente reverenciado por isso, e não qualquer outra pessoa ou empresa/igreja.
OK, MAS, QUAL O PROBLEMA?
– Nossa, Guifer, ultimamente você anda se apegando em temas que ninguém liga ou se incomoda. Qual o problema em dizer “Eu Sou a Universal” no lugar de “Eu sou de Deus!”, por exemplo? – alguns podem questionar (talvez até com certa razão pq não sou o dono da verdade).
O preocupante nisso tudo, caro leitor, está no marketing de emboscada, está na mensagem subliminar e na propaganda implícita que as (grandes) instituições religiosas – principalmente evangélicas – praticam descaradamente todos os dias, pois são as que deveriam se preocupar somente em “levar o evangelho a toda criatura” em vez de investir milhões para somente fortalecer sua logomarca, entendeu?
E apesar de ser algo aparentemente nebuloso para muitos, posso afirmar que nada do que você ouve ou vê dentro de uma igreja é por acaso.
Falando, por exemplo, em um contexto geral que envolve a maioria das igrejas evangélicas (que descobriram na fraqueza das pessoas uma mina de ouro e hoje preenchem cada esquina do Google Maps com seus templos), não somente a IURD ou Assembleia, mas as outras grandes denominações “concorrentes” também agem de um jeito similar e atuam forte na capacitação de quem for escolhido para representá-las.
Desde a postura do tal pastor, as roupas que veste, a inclinação corporal, a impostação de voz, o jeito de andar e olhar, e claro, a forma como lê e transmite sua interpretação bíblica durante a pregação, tudo é resultado de um trabalho de marketing (bem feito) para fisgar aquele cliente que ganhou apelido de fiel.
Assim como em qualquer segmento corporativo, funcionários que trabalham com religião são treinados para falar com seu público-alvo. Não por acaso existe um investimento nessa ‘indústria da fé’, até pelos líderes/empreendedores enxergarem de longe que nem todos que têm aptidão para subir ao altar e fazer uma pregação de 1H30 sem perder a credibilidade.
Ali estarão sempre pessoas escolhidas a dedo, com altíssimo poder de convencimento e de oratória quase que impecável. Estes certamente são dons presenteados por Deus, mas que, em minha opinião, deveria ser melhor empregados para o bem e não para o que eles têm realmente feito: aumentar o próprio patrimônio (ou do chefe, digo, fundador).
Com essa fala mansa já arrecadaram milhões de fãs e, principalmente, de reais. Sabe pq, caro leitor? Pq fanático religioso não pesquisa, não analisa e jamais questiona. O pior é que não fazem isso por concordar integralmente com tudo, mas, sim, por achar que vai para o inferno se acrescentar um ponto de interrogação no fim das frases durante um bate-papo com seu pregador favorito.
Eles, os líderes religiosos, não querem as pessoas raciocinando por saberem que as chances de o negócio decretar falência sobre para 90%.
Bom, melhor assim, né “carneirinhos”? O pastor/bispo/apóstolo/missionário falou, então, é amém!
ORAS, E PQ AS PESSOAS LEVAM TUDO COMO VERDADE?
Simples. Pq a igreja tem uma vantagem que empresas convencionais não têm: elas entram no caminho de pessoas que passam por alguma fragilidade na vida, seja no aspecto emocional, físico, espiritual, financeiro, amoroso, familiar ou profissional. E quando estamos sensíveis a um problema ou dor, só queremos nos livrar daquilo para desfrutar o melhor da vida na busca pela felicidade plena, e ponto. Não importa o preço, a gente vai e paga.
Se a pessoa promete que Fulano vai ficar bem, essa ideia é comprada de imediato por ele, pois não ele não aguenta mais esse sofrimento que já perdura por anos.
E eles… sim, eles… são ótimos comerciantes e convencem (quase) qualquer um de que a qualidade de vida que tu buscas está na igreja dele, e que lá na outra vocês vão encontrar um Deus diferente – que provavelmente não vai resolver o teu problema.
Deixe seus bens materiais e seja feliz; deixe a chave do teu carro ou da tua casa para receber a chave da felicidade.
É uma prática vender a cura de um Deus que nunca cobrou efetivamente por ela.
Ao estarmos fracos na fé – e também física ou emocionalmente -, nos tornamos suscetíveis ao mal-intencionado, já que essa tal ‘anemia da alma’ nos impede de questionar o preço de um novo sorriso. Essa debilidade nos faz entender que sorrir não tem preço, então, abraçamos tudo aquilo que nos é colocado guela-abaixo.
Eles, como não são bobos, estão cientes a respeito dessa percepção que temos, e isso nos torna uma presa ainda mais fácil.
Enfim, por tudo isso não vejo como exagero falar sobre este assunto, concorda?
Não trata-se de empresas que fabricam biscoitos, meu amigo. A pauta gira em torno do segmento religioso, de igreja, da fé mercantilizada, e isso muda tudo, já que essa ‘brincadeira’ leva o nome de Deus e tem impacto direto na sua vida e/ou na de outras milhões em todo planeta.
Estamos falando sobre pessoas que precisam de ajuda, de carinho e de milagre positivo, não de possíveis enganações e (mais) perdas além das que a vida já lhes propôs.
E quando o assunto é Deus, meu grande pai e a quem sou grato por tudo o que fez por mim, desculpe, mas aí não posso deixar de me posicionar.
Uma vez minha mãe disse uma coisa que nunca mais esqueci:
– Filho, quando você faz alguma afronta ao mal, Deus vem e nos protege; agora, quando faz ou fala algo contra Deus, não tem ninguém que o defenda! – e esse ensinamento ficou marcado.
Vejo a fé como sendo algo individual e, acima de tudo, sagrado. Por isso tenho pena das pessoas que brincam com a fé dos outros, sabe? Não é raiva e nem ódio, é pena. Pq o acerto de contas será doloridamente em dobro. Eles podem adiar, mas não podem evitar.
Para Deus é assim: “Mexeu com meu povo, mexeu comigo!”. E o lema de todas as pessoas que acreditam Nele também deveria ser: “Mexeu com Deus, mexeu comigo!”, do mesmo jeito que o Próprio faz quando nos traz paz de espírito, amor, compaixão, bênçãos e livramentos diários – sem medir esforços para isso.
No entanto, é uma prática da sociedade (que acredita em Deus) absorver os possíveis abusos que se vê/ouve a respeito do nome e do legado que o Senhor nos deixou e dos milagres que produz diariamente.
Conforme disse lá no início, entende-se como errado questionar os métodos de uma placa de igreja e, com isso, deixa-se de defender Quem realmente interessa. Deus tenha piedade.
Ps: Fui criado em berço evangélico e, independente de qualquer coisa, nunca deixei de ser temente a Deus (que para mim estará sempre à frente das coisas e no topo do meu pódio de vida).
Me considero um servo que diariamente mantém sua comunhão com Ele, embora não permita que atualmente exista interferência de terceiros em nossa relação. E, pq atualmente? Pq fui membro da Igreja Universal durante 14 anos da minha vida, ou seja, tenho propriedade para falar sem qualquer tipo de interesse.
Óbvio que não sou tolo em dizer que jamais voltaria à igreja (Universal ou qualquer outra), já que conheço minhas limitações humanas e sei que o dia de amanhã não pertence a mim e, principalmente, por não ter a menor dúvida de que, assim como qualquer outro lugar, a igreja tem sim poder de nos trazer paz de espírito, independente de seu nome fantasia, não por sua estrutura física, mas por a bíblia dizer que “Onde se reunirem dois ou três em meu nome, ali eu estarei!” (Mateus 18:20).
Tudo é uma questão de fé!
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Maravilhoso texto! Assino em baixo! A verdadeira graça do no Sr Jesus Cristo propaga a salvação da alma e não bens materiais, e jamais o pregador ganhará salário! E sim uma obra da piedade para os necessitados! Essa é minha fé! Parabéns grande escritor e jornalista Fernando Guifer