“Minha filha passou 80 dias no hospital e estive ao lado dela por 80 dias. Médicos, enfermeiros e mães estranhavam o fato de eu, homem, estar lá diariamente fazendo minha pura obrigação”.
O depoimento é do jornalista Fernando Guifer, de 33 anos, pai de Laís, que nasceu com apenas 29 semanas. Segundo ele, a ausência de outros pais na UTI neonatal chegava a ser “cruel”. Por isso, sua presença constante chamava atenção.
“Esse estranhamento é reflexo de uma sociedade composta por muitos maus pais, que não se fazem presentes nos momentos de maior necessidade de um filho”, reflete Fernando.
Pai de filho prematuro: aprendizados na UTI
O nascimento prematuro aconteceu em decorrência de uma embolia pulmonar da mãe, que passou uma semana internada no hospital. Com os medicamentos que a mãe precisou tomar, a bebê parou de se mexer dentro da barriga.
“Ao longo dos dias, minha filha, que sempre mexeu muito, começou a silenciar no ventre. Foi então que os médicos entenderam que a cesárea era imprescindível para tentar salvar também sua vida (uma vez que a da mãe era prioridade)”.
A cirurgia para retirada da bebê precisou ser feita antes do tempo, ainda nas 29 semanas (o nascimento natural acontece entre as 38 e 42 semanas).
Passado o parto, veio o período dentro da incubadora de acrílico, que foi cheio de intercorrências: a mais grave delas foi uma hemorragia intracraniana que deixou sequelas em Laís que só seriam descobertas mais tarde (o problema afetou seu aspecto neurológico e hoje ela passa por muitos especialistas para vencer os problemas e, assim, poder levar uma vida normal na fase adulta).
Com a mãe também debilitada, a presença do pai assegurou todo o carinho de que ela precisava para se recuperar.
“Amadureci três décadas”
Hoje a pequena Laís já tem cinco anos de idade. A experiência no hospital nos primeiros dias de vida da filha foi dura, mas rendeu muitos ensinamentos. Isso tudo deu origem ao livro “Diamante no Acrílico: Entre a Vida e o Melhor Dela”, onde Fernando fala sobre o período de recuperação de Laís.
Na época, inclusive, a ONG Prematuridade.com foi fundamental para que Fernando conhecesse mais desse universo e pudesse entender o que se passava com Laís – ele, hoje, é voluntário no projeto, que é um dos poucos voltados à causa dos bebês prematuros no Brasil.
Apesar de todo o sofrimento, o pai considera que a temporada no hospital contribuiu “300%” para o seu aprendizado sobre paternidade e o aproximou ainda mais da filha: “Amadureci umas três décadas com a experiência da prematuridade extrema”.
“Creio que a paternidade, por si só, já me traria uma bagagem diferenciada, mas o universo dos prematuros é surreal. Sair do hospital durante 80 dias com possibilidade de encontrar a incubadora vazia é angustiante. Deixava o hospital com os braços vazios e a alma em pedaços, e isso me fez forte e estreitou ainda mais nossos laços como pai e filha”.
Papel dos pais na sociedade
Ao perceber a importância de sua presença neste momento, bem como a ausência da maioria dos pais na UTI neonatal, Fernando reflete sobre a criação dos filhos para formar homens mais responsáveis: “Precisamos orientá-los e conscientizá-los para serem pais presentes no futuro”.
“Uma epidemia irresponsável que vivemos hoje é o abandono parental e o impacto negativo que isso causa na vida de milhões de pessoas em todo o mundo é assustador. Uma nação com pais presentes é uma nação mais saudável”, conclui Fernando.
___________________
Fonte/Publicação original: http://bit.ly/2MqymwH