[ Nada. Absolutamente nada justifica a – de novo – ação criminosa da Polícia. Mas, por favor, parem de romantizar ‘pancadão’! ]
NADA! NADA! NADA!
ABSOLUTAMENTE NADA justifica a ação despreparada da Polícia Militar em Paraisópolis, que agrediu jovens rendidos, desarmados e provocou uma série de mortes devido aquela emboscada covarde que gerou pisoteamento.
NADA justifica. Nem o fato de os próprios moradores terem acionado a Polícia para a referida ocorrência pela milésima vez.
Não faz sentido a Polícia dizer que esteve em Paraisópolis para “escoltar o evento e proteger os frequentadores do pancadão”, como vi uma representante da corporação mencionar na TV. É patético. É óbvio que a Polícia foi lá com objetivos muito claros e, infelizmente, muito infelizmente, os cumpriu.
Mas também…
NADA! NADA! NADA!
ABSOLUTAMENTE NADA justifica 5 mil jovens se juntarem semanalmente para fazerem na via pública um “Rock in Rio” que atravessa a madrugada, ainda mais na porta de famílias sem prévia autorização e consentimento destas.
NADA justifica. Nem o fato de opções culturais serem escassas na quebrada.
Não faz sentido dizer que a falta de lazer na região é motivo para fazer esse tipo de pancadão de qualquer jeito, desordenado, em qualquer lugar, e que isso é uma forma de também atacar o poder público para que passe a ter essa preocupação e olhar cultural para com as periferias.
Isso é protestar errado, na porta errada, da forma errada e contra as pessoas erradas.
Não se atinge o Governo atacando a própria comunidade, pois lá existem pais e mães de família que precisam – e merecem – descansar para, no dia seguinte, buscar novamente o sustento dos filhos. E, infelizmente, os únicos prejudicados verdadeiramente são eles, uma vez que, bem longe dali, em bairros nobres, os Srs. João Dória (governador) e Bruno Covas (prefeito) dormem seus sonos dos anjos.
Quando 5 mil jovens resolvem fazer pancadão na porta de moradores da favela, estão agindo como inimigos dela, prejudicando cidadãos mais sensíveis e que deveriam ter suas integridades preservadas pela própria comunidade, como idosos, bebês, autistas, deficientes, enfermos em tratamento e famílias inteiras que têm seus direitos em ir e vir cerceados por pessoas que, na maioria das vezes, nem são da comunidade, mas que vêm de outras regiões para “se divertirem”, “causarem” e deixarem as portas de seus iguais imundas no dia seguinte com latas, garrafas, papéis, plásticos, pinos de cocaína, seringas, preservativos usados, entre outros objetos lamentáveis em se encontrar na via pública.
Sei o que é viver isso e meu relato é por experiência própria, não achismo.
Ninguém gosta de ter um pancadão ou qualquer evento de tamanha magnitude na janela de casa, quase derrubando as paredes, impossibilitando uma simples noite de sono em paz ou, quiçá, um diálogo com a família na mesa do jantar após um dia cansativo de trabalho.
Quem vive ou já viveu esses pancadões na porta de casa sabe o INFERNO que isso é na vida de quem é obrigado a conviver com o som alto, violência (entre os próprios participantes, inclusive), sexo explícito e drogas ilícitas de tudo quanto é natureza. Tudo na própria fuça e também na das crianças.
Entenda: a música ‘Funk’ não é o problema. O Funk em si, gostando ou não, é figura importante na cultura musical do nosso país, já que consolidou seu espaço e merece todo reconhecimento possível.
Mas uma coisa que precisa ser minimamente discernida é: a música ‘Funk’ é cultura; o evento ‘pancadão’, não. Ele é baderna. E colocá-los no mesmo balaio somente endossa o preconceito já existente com o (infelizmente) marginalizado Funk.
Ou seja, o problema não é o ritmo em si, mas sim, a falta de respeito dos organizadores e frequentadores para com seus próprios moradores da comunidade – que também levam uma vida sofrida pela simples sobrevivência diária.
Poderia ser qualquer outro gênero musical. Seu espaço termina onde começa o do próximo. Regra básica de educação e empatia.
De novo: o erro dos jovens em promover pancadão na porta dos outros devido à falta de opções culturais não justifica as atitudes assassinas da Polícia de SP, assim como o erro do poder público em não ofertar opções culturais à periferia não justifica a realização de pancadões na porta de famílias que sequer consomem esse tipo de diversão.
Há uma série de erros cometidos por todos os lados. Um, é claro, não justifica o outro. Mas temos que ser justos e analíticos, não podendo esbugalhar os olhos para o ‘A’ e colocar uma venda nesses mesmo olhos para o ‘B’.
Qualquer comunidade que sofre com pancadões clama por uma solução urgente – e pacífica. Óbvio que se você fizer uma pesquisa ninguém dirá que é contra, pois o medo impera. Mas é perturbador.
Minhas condolências às famílias que perderam seus entes queridos nessa tragédia e minha solidariedade também às famílias que continuarão convivendo com “eventos” do tipo sem qualquer perspectiva de respiro.
Sobre a tragédia, não houve acidente, houve crime. E que os responsáveis paguem caro por cada vida ceifada.